Esperança Garcia
Em 1770, uma mulher negra, mãe, escravizada, escreveu uma carta em 6 de setembro, endereçada ao governador da capitania do Piauí. Nela, Esperança Garcia denunciava as situações de violência que ela, as companheiras e seus filhos sofriam na fazenda de Algodões, como pequenos maus-tratos físicos, além de proibição dos escravos da fazenda de se confessarem e de batizarem seus descendentes.
O documento histórico é uma das primeiras cartas de direito que se tem notícia é considerado o primeiro Habeas Corpus do Brasil.
Assim, Esperança Garcia foi a primeira mulher a praticar advocacia no país, ainda no século 18, conforme oficializado em dezembro de 2023 pelo Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB).
Para os historiadores, ainda que na época não existisse direito formalmente constituído, a carta tem natureza jurídica, uma vez que adota caráter de petição, além de Esperança demonstrar conhecer a função das autoridades, do poder exercido pelo governador na época e dos seus poucos direitos.
Em razão de seu reconhecimento, foi instalado também um busto em homenagem a Esperança Garcia na sede nacional da OAB, em Brasília.
Leia aqui a Carta de Esperança.
Myrthes Gomes de Campos
Pioneira para além do direito, mas para a sociedade brasileira, a primeira mulher a exercer a advocacia no Brasil foi Myrthes Gomes de Campos. Ela se inscreveu no Instituto dos Advogados do Brasil, que antecedeu a OAB, e estreou no Tribunal do Júri do Rio de Janeiro em 1899 para defender um homem acusado de ter agredido um terceiro a golpes de navalha. A defesa se transformou em fato público por ser a primeira vez que uma mulher patrocinaria uma causa judicial.
Com a plateia lotada para assistir à sua atuação, Myrthes surpreendeu o juiz, os jurados e até o réu, demonstrando profundo conhecimento do Código Penal e, sobretudo, pelo poder de argumentação. Ela venceu o promotor, até então considerado imbatível, e conseguiu a absolvição do réu.
Myrthes, nascida em Macaé (RJ) em 1875, formou-se em 1898 no Rio. Outras mulheres já haviam se formado em Pernambuco, mas nenhuma chegou a exercer a advocacia. Apenas em 1906 conseguiu legitimar-se profissionalmente, quando ingressou no quadro de sócios efetivos do Instituto dos Advogados do Brasil (IAB), condição necessária para o exercício profissional. A Comissão de Justiça, Legislação e Jurisprudência se pronunciou a favor de Myrthes, por meio da Revista da IOAB, sustentando que não havia qualquer lei que impedisse a mulher de exercer o ofício. Mesmo com o parecer, apenas sete anos depois ela teve a filiação aprovada em assembleia e foi totalmente aceita.
Deixou obra consistente no campo da jurisprudência, destacando-se sua atuação em trabalhos em prol da liberdade feminina, como artigos que discutiam a questão do voto feminino, a mulher como jurada e a emancipação jurídica da mulher. Myrthes morreu em 1965, no Rio de Janeiro¹.
Esperança e Myrthes foram as mulheres percursoras da advocacia e do mundo jurídico no Brasil, mas a trajetória foi árdua e longa, desde a estreia de Myrthes, foram necessários 55 anos para que uma juíza fosse empossada no Brasil. O feito coube à magistrada de Santa Catarina Thereza Grisólia Tang, em 1954. Após o fato, outros 46 anos se passaram até que uma mulher, Ellen Gracie, fosse admitida no STF.
Hoje a presença feminina nas carreiras jurídicas é crescente, mas ainda há diferenças a equacionar.
Muito se fez e há ainda muito a se fazer!
Feliz dia das Mulheres, em especial às operadoras do Direito.
FONTE: Agência Brasil, Instituto Esperança Garcia, OAB do Distrito Federal, Conselho Federal da OAB. ¹Retirado na íntegra de: https://www.oab.org.br/noticia/60107/juristas-que-marcaram-a-historia-do-pais-myrthes-gomes-de-campos
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